“Eu não vou para lugar nenhum. Eu quis aprender, e você me ensinou por alguma razão. Eu continuo sendo quem eu era. Eu acho.”

Quase todo fã de “The Walking Dead” já desejou a morte do padre Gabriel. A postura do religioso, sempre covarde, muitas vezes eticamente duvidosa, foi suficiente para que ele caísse em desgraça com quem acredita que a série precisa apenas de matadores e personagens capazes de derramar ainda mais sangue em prol do grupo de Rick, Michonne, Carol & Cia.

Entre traições e tentativas de mudança, o padre teve altos e baixos. Não hesitou antes de mostrar insegurança, medo, incapacidade de ser quem todos gostariam que ele fosse. Não pensou duas vezes antes de entregar atitudes que, na cabeça dele, eram erradas. Erradas ou necessárias. Fossem ou não.

Acontece que Gabriel, aos poucos, deixa de ser o padre Gabriel. Não no sentido de abandonar a batina, a crença ou os ideais, como ele mesmo deixou claro. Mas, sim, na percepção de que tão importante quanto se integrar de vez ao grupo é ir às armas e lutar.

O "novo" padre gabriel: batina e uma arma, andando lado a lado.
O “novo” padre Gabriel: batina e uma arma, andando lado a lado.

Não apenas porque é essencial que cada um que seja capaz faça isso. O grupo de Rick, hoje, não é apenas inferior aos zumbis. É inferior aos humanos que sobreviveram e vão fazer de tudo para continuar sobrevivendo. Esqueça-se de Hilltop, pelo menos neste momento. Os Salvadores são a ameaça, como todo mundo sabe (“Somos todos Negan”).

A fé, sabe-se, tem altos e baixos, até mesmo naqueles que a adotam como ideal de vida e força motriz. A fé está muito relacionada a resultado. Quando se reza, na imensa maioria das vezes, se espera algo em troca. As pessoas pedem bênçãos, milagres, realizações materiais ou espirituais. Quando isso não vem, é natural que muita gente questione se “está sendo ouvida, mesmo, ou não”.

É evidente que, aqui, se trata de uma discussão muito, muito maior. E pessoas como o padre Gabriel, os da vida real, claro, são muito menos suscetíveis a esse tipo de recaída. Mas explica um pouco, pelo menos, o que se sente em situações assim.

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Gabriel percebeu, enfim, que a fé que ele tem em alguma força maior não é suficiente para que ele tenha a paz interior que gostaria. Em um certo momento, ficar alheio à situação não adianta mais. Nem na parte da força tarefa nem na sensação de assistir a tudo o que está acontecendo de maneira inerte. Pessoas estão morrendo. É complicado, para alguns, apenas segurar um terço nas mãos enquanto isso acontece. Principalmente quando se percebe que todos – ou muitos, pelo menos – ao redor estão mudando para se adaptar à realidade.

E o padre resolveu fazer o mesmo. Decidiu, de vez, ir para o front. Armou-se e se despiu de certo pudor. Deixou de lado uma certa barreira intelectual, naquilo que pode significar, enfim, o desenvolvimento de um personagem que, até aqui, vinha contribuindo pouco para a série. Resolveu, quem sabe, interpretar de outra maneira os pecados que um dia cometeu. A culpa que carrega por um passado não tão ortodoxo, que talvez tenha impedido que ele crescesse mentalmente, vai ficando para trás.

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É evidente que essa transformação será gradativa. É evidente, também, que não está nascendo um novo Rick. Mas é inegável que o padre Gabriel de antes, aos poucos, vai deixando de existir para dar lugar a Gabriel. Apenas Gabriel, movido pela fé e, também, pela coragem de, enfim, estar lado a lado de quem ele tem de estar. Sem sair executando um por um, é claro, mas não tão passivo como sempre foi.

Não, ele não vai abandonar Deus, mas, quem sabe, tenha decidido ficar um pouco mais ao lado e familiarizado com um tal Jesus que anda para lá e para cá.